entrevista com marcos custódio
“Para ser voz de esperança e mão do cuidado de Deus para os que sofrem com as mudanças climáticas, A igreja precisa estar ciente e conhecer os temas que afligem a humanidade e o planeta.”
As mudanças do clima são uma realidade. Diante disso, qual o lugar da preocupação com o meio ambiente na fé cristã? É possível equilibrar devoção e cuidado da criação? Há quem não acredite nesse equilíbrio. Graduado em Química, especialista em sustentabilidade e mestre em alimentos e nutrição, Marcos Custódio acredita na necessidade de integralidade da fé, que abraça todos os aspectos da existência humana, incluindo o cuidado da criação. Neste sentido, a igreja tem um papel importante frente às mudanças do clima. Segundo ele:
A igreja, como parte integrante da sociedade, precisa estar ciente e conhecer os temas que afligem a humanidade e o planeta, para ser voz de esperança e mão do cuidado de Deus para os que sofrem com as mudanças climáticas.
Custódio foi diretor de uma das principais organizações ambientais cristãs com atuação no Brasil, A Rocha Brasil, e já passou por diversas organizações do terceito setor. Atualmente, é membro de Comitê Gestor do Movimento Renovar Nosso Mundo. Aos 51 anos, ele conversou conosco sobre sua experiência profissional, suas preocupações ambientais, referências teóricas sobre teologia da criação e porque se envolver com o Renovar Nosso Mundo. Confira a entrevista:
Fale um pouco sobre sua formação e experiência profissional:
MC: Sou Bacharel em Química, com especialização em sustentabilidade e com mestrado em alimentos e nutrição. Atualmente, estou cursando relações internacionais. Minha experiência profissional é bem diversa. Estivemos muitos anos na academia realizando pós-graduação, estive muitos anos trabalhando na gestão estratégica de organizações socioambientais e atualmente trabalho como consultor, na área de gestão e de sistemas de qualidade, segurança dos alimentos e sustentabilidade, em empresas de alimentos por todo o Brasil.
Que lugar as questões socioambientais, ou de cuidado da criação, ocupam na sua vida, ministério ou profissão?
MC: Ocupam um espaço central. Sempre estive ligado a questões socioambientais (desde a juventude) e sempre busquei me envolver de forma prática para auxiliar no cuidado da criação. Já fiz parte de diretoria estatutária de diversas organizações socioambientais, já fui diretor executivo de ong’s e fundação e, atualmente, dou suporte estratégico para algumas organizações como forma de demonstrar meu compromisso (e chamado) para estar neste cuidado contínuo com a criação.
Qual passagem bíblica mais lhe toca e lhe inspira quanto ao cuidado da criação?
MC: Genesis 2:15: Então o Senhor Deus pôs o homem no jardim do Éden, para cuidar dele e ne fazer plantações.
Por que a igreja deve se envolver com as questões climáticas e socioambientais? Você acha que a igreja hoje está mais sensível ou engajada diante dos problemas que destroem da criação de Deus?
MC: A igreja, como parte integrante da sociedade humana, precisa estar ciente e precisa ser conhecedora dos grandes temas que afligem a humanidade (e o planeta), até como uma voz de esperança e ser a mão do cuidado de Deus para todos aqueles que sofrem diante das mudanças que afetam o planeta e a civilização (assumirmos o chamado de embaixadores). De forma geral, a igreja desconhece este tema e o nível de engajamento da igreja cristã é praticamente zero. A complexidade do mundo atual criou demandas diversas, que igreja tem tido dificuldade em estudar, compreender e se aprofundar. O cuidado da criação parece ser visto por muitas igrejas como um assunto muito periférico e sem nenhum tipo de importância para as muitas comunidades cristãs. Claro que existem pequenas ações espalhadas pelo mundo, mas elas não são suficientes para mudar a trajetória atual.
Quais suas principais preocupações atuais quanto ao meio ambiente e ao clima? Como a igreja pode contribuir para encontrarmos soluções a esses desafios?
MC: Acredito que há duas grandes preocupações com as questões climáticas. Primeiro, como iremos adaptar nosso estilo de vida (economica, transportes, gestão publica, produção de energia, agricultura, etc…) a um clima que está se tornando muito mais hostil, complexo e instável. Segundo, como será “cuidar” das pessoas que serão altamente impactadas pelas mudanças climáticas (refugiados climáticos) – pessoas que precisaram sair de suas casas, cidades e países por causa de fenômenos do clima, que precisaram reconfigurar seu estilo de agricultura, moradia, sobrevivencia. E como iremos lidar com aspectos da falta de água e alimentos. A igreja pode contribuir muito no socorro e atendimento, tanto social como psicológico, para as pessoa que precisarão de cuidado e esperança, neste tempo tão complexo.
O que você falaria para um cristão que se preocupa com a mordomia ambiental? Como equilibrar devoção cristã e cuidado da criação?
MC: Em tempos como o nosso, aconselhar alguém virou um risco. Desta forma, eu pensaria em me informar, buscar conhecimento, ouvir e ver cristãos sérios, advindos de boas tradições cristãs, que já escreveram ou escrevem sobre a mordomia cristã com a criação. Para começar, eu citaria Jonh Stott.e Francis Schaeffer como uma iniciação para quem quer começar. Estudar e abrir a mente é uma das práticas cristãs mais importantes (nunca devemos esquecer o que os bereanos fizeram com Paulo). Eu, particularmente, não acredito em equilibro entre devoção cristã e cuidado da criação. Acredito na necessidade de integralidade da nossa fé, que não deixa de lado os diversos aspectos da existência humana, como o cuidado da criação.
Na área de teologia da criação, mordomia ambiental e ativismo climático, quais obras você recomenda?
MC: Confesso que, quando li a pergunta, a expressão “ativismo climático” não me deixou muito confortável, pois me remete a batalhas (não que ela não exista), e que, talvez, não seja o nosso principal campo de lutas. Enfim, há um livro básico, simples e direto, que é uma literatura obrigatória: Jesus e a Terra (James Jones). Ele oferece uma visão básica interessante para quem quer começar. Francis Schaeffer tem um livro clássico chamado Poluição e a Morte do Homem, que trata de forma bem direta o papel do homem na poluição do planeta. Estes textos básicos são essenciais para se começar. Atualmente, há muito material online do Timóteo Carriker, um autor americano/brasileiro, teólogo e integrante do GT Teológico do movimento Renovar Nosso Mundo, que tem feito excelentes textos. Recomendo que busquem e leiam seus trabalhos.
O que lhe motiva a participar do movimento Renovar Nosso Mundo e porque outras pessoas deveriam se envolver?
MC: Porque movimentos como o RNM podem ser um vento de esperança, um espaço de acolhimento e um canteiro de ações que podem mudar algumas realidades e influenciar nossa sociedade. Mesmo em sua diversidade e complexidade, o RNM é um espaço de esforço real para se debater o tema e ajudar em sua difusão. Portanto, participar dele é participar do corpo de Cristo que está comprometido em trazer esta temática para a realidade das igrejas locais, mesmo com todas as dificuldades que existem atualmente para uma movimento como este.
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